sábado, 6 de outubro de 2018

FINAL DE CAMPEONATO

Era primavera.
E de 4 em 4 anos acontecia na floresta uma corrida. Podia participar qualquer bicho, dos maiores aos menores, mesmo os que não tinham preparo algum. O sistema era bem democrático. Alguns animais, durante o intervalo de uma edição para outra, preparavam-se. Já outros, nem sinal de vida davam. Mas reapareciam bem na época da corrida prometendo mundos e fundos.
A corrida acontecia em várias etapas e em cada uma delas era feita uma peneira e aos poucos iam sendo eliminados os retardatários. Ao final, só restavam quatro equipes que podiam concorrer ao título. Cada time era representado por uma bandeira.
Naquele ano, os que ainda tinham chances de competir na grande final eram os times Azul escuro, Vermelho sangue, Laranja aguada e Verde exército. Cada equipe era composta por seus jogadores e um técnico.
A equipe laranja pela primeira vez participava da competição. A hiena, a minhoca, o canguru e o jabuti representavam este time. Ainda estavam meio perdidos no esquema... não sabiam como agir ao certo, se precisavam se aquecer antes, ou se já deveriam sair correndo. Até tinham potencial para ganhar o campeonato, mas não tiveram tempo de se prepararem. Talvez na edição seguinte, quem sabe, poderiam se destacar mais entre os primeiro colocados.
A equipe azul era composta pelo tucano, bicho-preguiça, pelicano e pelo papagaio. Eles sabiam que o time estava fraco, que não tinham condições de ganhar – mais uma vez – mas mesmo assim não “largavam o osso” (até parecia que o cachorro fazia parte deste grupo). O papagaio, então, ficava repetindo e repetindo impropérios contra os adversários, na tentativa de diminuí-los. Estratégia que se mostrou totalmente ineficiente.
Assim como em qualquer campeonato, a presença de competidores desleais também se fazia presente nesta corrida. Era possível ver seres corruptos e inescrupulosos, dispostos a fazerem de tudo para prejudicar o adversário, competindo com um sorriso no rosto e a cara mais lavada do mundo. Uma pena.... Há anos os honestos vinham tentando desmascará-los. A torcida já tinha percebido que muitos dos resultados passados não tinham sido totalmente corretos. Por isso, estava polvorosa nas arquibancadas, atenta a qualquer atitude suspeita e resultado fraudulento.
A equipe vermelha, por exemplo, tinha ganhado os últimos quatro campeonatos. De maneira suspeita, diga-se de passagem. Na última edição da corrida, inclusive, o título foi retirado das mãos da anta por suspeitas de fraude nos resultados.
Para esta edição da competição, a equipe era composta pela anta (ela não desistia...), o jumento, o lobo – com sua vestimenta de pele de cordeiro – e a cobra. O técnico da equipe vermelha era o morcego. Sabe-se lá porque o escolheram, já que ele estava preso na caverna e não podia sair durante o dia para acompanhar a competição. Sempre que seus pupilos precisavam de orientação tinham que ir até aquela “prisão” para escutar o que o chefe iria mandar fazer.
Liderando todas as etapas da competição e a preferência da torcida estava a equipe Verde. Também era a primeira vez que este time participava do campeonato nacional. Seus competidores eram a águia, o cachorro, o leão e o coelho. Rápidos nas provas, não respondiam às provocações dos adversários com ofensas, eram leais nas disputas e tinham tudo para levantar a taça.
O problema era que nem tudo eram flores e já tinham tentado sabotar a equipe que liderava o ranking.
Uma das competidoras – a águia – quase morreu em uma das etapas. Fora atingida por uma árvore cheia de espinhos venenosos quando comemorava com os torcedores a vitória de uma das fases. Ela estava sendo carregada nos braços por seus fãs quando foi atingida no abdômen. A equipe da polícia da floresta logo instaurou inquérito para apurar o atentado, já que árvores espinhentas nem existiam naquele lugar.
Depois do atentado a coisa ficou mais séria.
Os torcedores não perdoaram:
“Onde já se viu tamanho despautério?? Um galho enooorme, cheio de espinhos num trecho do percurso onde nem galhos nem árvores folhosas existe? Claaaaaro que foi alguém que propositalmente o colocou exatamente onde a águia passaria...”
Os ferimentos na ave foram mais sérios e profundos do que todos haviam imaginado. Por pouco ela não tinha passado desta para melhor.
Mas sob cuidados veterinários ela renasceu das cinzas como uma fênix, mais linda e mais forte e com a convicção de que ela estava no caminho certo. Ela não era de desistir fácil.
Enquanto a águia esteve fora de combate, os outros animais bem que tentaram levar vantagem sobre a pobre coitada que convalescia, impotente. Só que os torcedores viram que não podiam deixar mais essa “passar batido” e muitos se uniram para torcer ainda mais por ela.
Durante todo o tempo a anta não falava coisa com coisa, o jumento só dava coice para todos os lados, o tucano bicava tudo o que via pela frente e o bicho preguiça, preguiçoso que só ele, só queria saber de conversar e propor medidas descabidas para a competição. O lobo tentava morder até seus aliados e a cobra esperava pacientemente o momento certo para dar o bote.
Quando a corrida entrou na reta final e os competidores estavam alvoraçados com a disputa, já não sabiam mais o que fazer para levar vantagem. Há muito já tinham se esquecido de “dar o seu melhor” e tentavam agora a todo custo denegrir a imagem do adversário e prejudicá-lo como podiam.
Os líderes continuavam na frente e a vitória era só uma questão de tempo para vir para o lado verde da força.
Ao povo, os torcedores, só restava aguardar a derradeira prova final para soltar o grito de “É CAMPEÃO” com os verdadeiros merecedores da vitória.
O resultado não poderia ser diferente da vida, onde só se colhe o que se planta e ser honesto deveria uma virtude obrigatória de todos.

Sem comentários: